sábado, 23 de julho de 2016

Presentes de aniversário...


Oi, pai:

Hoje é seu aniversário 9.6
Hoje não vou falar de como você foi o solteiro mais cobiçado dos anos 40, nem vou contar que você dançava tango valsa bolero paso-doble jazz puladinho samba polca e outros gêneros de dança de salão, nem comentar que você jogava biriba buraco tranca roleta canastra poker e outros jogos de cartas.
Hoje vou falar das coisas que você gostava, e são exatamente essas coisas que eu quero lhe oferecer neste aniversário.

A rádio-vitrola Telefunken que tocava discos grossos de vinil de 78 rotações; cada disco tinha dois lados, lado A e lado B, e cada lado tocava uma só música.

A televisão Mullard de válvula, que tinha que ser ligada meia hora antes do Reporter Esso porque precisava  esperar “esquentar” para aparecer a imagem.

A Companhia Telefônica de Friburgo para onde íamos a família inteira para ligar para o Rio, e onde ficávamos algumas horas esperando a telefonista fazer a chamada.

O trem maria-fumaça que quando fazia a curva na serra depois de Cachoeiras de Macacu provocava uma chuva de fuligem que entrava pelas janelas dos vagões atrás, sujando toda a nossa roupa.

A brilhantina que deixava o seu cabelo brilhoso e irretocável.

Tshubtshik – Klezmer russo. https://www.youtube.com/watch?v=DWWEMvHBin8

A sua cidade materna, Ostrowiec, de onde você teve que fugir aos 18 anos, deixando tudo para trás, a casa, a marcenaria que fornecia móveis para Varsóvia, a infância perdida, a carreira mal começada e inconclusa.

Tudo isso eu lhe ofereço hoje como presente pelo seu aniversário.

Com carinho,

Sua filha.






sábado, 28 de maio de 2016

Economia segundo Moshe Pitchon



O filósofo Maimônides afirma que a verdadeira caridade é aquela que não se divulga. No entanto, hoje recebi um texto do pensador do judaísmo humanista Moshe Pitchon a respeito de renda, recursos e distribuição. Ele afirma que todos os bens que existem ao dispor dos homens, na verdade, não lhes pertencem: "Na teoria econômica judaica, os seres humanos são apenas mordomos ou depositários dos bens de Deus. A responsabilidade humana é a de gerir adequadamente a riqueza que Deus confiou aos seus cuidados. No judaísmo, considerações de caridade, moralidade e bondade são parte da estrutura do mercado." Achei significativo receber o texto em que Pitchon desenvolve o parágrafo que transcrevi acima, bem no dia em que faço meu trabalho social e voluntário. Isso, de certa forma, me autoriza a compartilhar o sentimento que tive durante um dia em que só fiz doação: pouco consumo e muita doação. Agora, ao final do dia, sinto alegria por ter dedicado meu tempo de sábado aos outros, enquanto eu mesma também me sinto gratificada. Alegria por ter administrado bens e conhecimentos numa distribuição que faz o mercado mais justo e menos ambicioso. E fico pensando em outros dias como este, de pouco consumo e muita doação.

domingo, 28 de fevereiro de 2016

Cenas do cotidiano...



Coisas que só têm valor muitos anos depois. Como não perceber em tempo real a riqueza desta imagem? Um segundo de tempo capturado por alguém, provavelmente pela neta, minha filha, que fez o comentário no verso ao achar a foto entre os seus guardados numa visita ao seu quarto de solteira na minha casa...

A estante com as fotos dos filhos e netos, a planta vistosa, cuidadosamente tratada pela matriarca que tinha mãos férteis, o patriarca examinando documentos, talvez faturas, e a filha providenciando ao telefone, ainda de disco, algum exame, alguma visita técnica, mas eu daria tudo para me lembrar da finalidade do telefonema sob o olhar de aprovação da minha mãe e o sorriso de sossego do meu pai !

E no alto, à esquerda da foto, a Mezuzá, o símbolo da espiritualidade, esta que nunca nos abandonou e jamais nos abandonará, assim como nós também não a abandonaremos.

Se eu soubesse que cada segundo de tempo tem tanto valor, eu teria feito alguma coisa diferente...

É como ver o sagrado nas cenas do cotidiano que não voltam mais.